segunda-feira, 23 de maio de 2011

DIAGNOSTICO DO FEOCROMOCITOMA.



DIAGNÓSTICO

O diagnóstico baseia-se na demonstração da produção autônoma de catecolaminas ou seus metabólitos, sendo disponíveis, em nosso meio, as dosagens de ácido vanililmandélico (VMA), adrenalina e noradrenalina plasmáticas e urinárias, metanefrinas e normetanefrinas urinárias, além dos testes funcionais e métodos de imagem.
1) Diagnóstico laboratorial
a) Ácido vanililmandélico
Para dosagem do ácido vanililmandélico, colhe-se urina de 24 horas, mantendo a amostra refrigerada e em conservante ácido. Utiliza-se o método espectofotométrico e, mais recentemente, cromatografia líquida de alta pressão (HPLC) para sua leitura. Agbaba et al. descreveram o método de thin layer chromatography (TLC), parecendo ser um método densitométrico quantitativo simples, rápido e com boa acurácia. Contudo, várias substâncias podem interferir na excreção do ácido vanililmandélico, aumentando-a como ácido nalidíxico e anilerida, porém outras inibem a excreção como a metildopa, inibidores da MAO e clorfibrato1,6,7,11,12.
Peaston et al. relataram grande número de falsos-negativos, principalmente se há falta de enzimas intratumorais para o metabolismo das catecolaminas em VMA, sendo indicado seu uso somente em associação com as dosagens de catecolaminas urinárias ou metanefrinas urinárias. A sensibilidade e a especificidade encontradas por estes autores foram, respectivamente, de 81% e de 88%, quando o VMA é dosado isoladamente. Já Graham et al. encontraram sensibilidade de 70% na dosagem do VMA, atingindo-se o valor de 100% quando reduzido o cut-offde 9,5mg/24h para 6,9mg/24h, porém com redução da especificidade de 98% para 92%12,13.
b) Adrenalina e noradrenalina plasmáticas
Dosagem através de amostra de sangue isolada, mantida em tubo gelado, com agente redutor, e centrifugada sob refrigeração, já que as catecolaminas são lábeis. Leitura realizada antes por método radioenzimático, gás-cromatografia/espectrofotometria de massa e, atualmente, por HPLC1,13-15.
Muitos fatores podem interferir na dosagem de catecolaminas, ao aumentarem sua produção, como stress, infarto agudo do miocárdio, acidente vascular cerebral, hipertensão intracraniana, hipoglicemia, bloqueadores dos canais de cálcio, a1bloqueadores, nitroprussiato de sódio, inibidores da MAO. Já, outras drogas reduzem os níveis de catecolaminas, como inibidores da enzima de conversão e a-2-agonistas5-7.
Como as catecolaminas são secretadas intermitentemente pelo feocromocitoma, a dosagem isolada pode não contribuir no diagnóstico, a não ser que os valores sejam muito elevados (catecolaminas plasmáticas maiores que 2.000pg/mL). Por outro lado, alguns autores relatam catecolaminas plasmáticas normais durante períodos de normotensão. Valores menores que 500pg/mL são considerados normais, e valores entre 500 e 2.000pg/mL não dão certeza diagnóstica. Sendo assim, as catecolaminas plasmáticas não devem ser utilizadas isoladamente comoscreening inicial do feocromocitoma. Cerca de um terço dos casos estudados por Bravo apresentaram níveis de catecolaminas semelhantes aos dos hipertensos essenciais2,6,9.
As catecolaminas devem ser dosadas separadamente para maior positividade do método. A sensibilidade é de 72%, e a especificidade é de 99% quando a adrenalina e noradrenalina são dosadas separadamente16.
c) Adrenalina e noradrenalina urinárias
Dosagem através de urina de 24 horas, mantendo-se a amostra acidificada e refrigerada. Leitura anteriormente realizada por método fluorimétrico e, mais recentemente, por HPLC. Semelhante às catecolaminas plasmáticas, devem ser dosadas separadamente. Fatores que interferem na dosagem das catecolaminas urinárias são os mesmos das plasmáticas. Em processos que cursam com hiper-reatividade do sistema simpático adrenal, a excreção de catecolaminas, geralmente, não excede três vezes o limite superior da normalidade1,6,7.
Peaston encontrou sensibilidade de 90% e especificidade de 74% na dosagem de adrenalina, e de 58% de sensibilidade e 84% de especificidade na dosagem de noradrenalina, mas, ao somarmos ambos, a sensibilidade subiu para 97% e a especificidade para cerca de 72%. Por outro lado, Graham encontrou sensibilidade de 100% e especificidade de 97% quando a dosagem de adrenalina era associada à de noradrenalina12,13.
Em outro trabalho, observou-se nos tumores produtores mistos de adrenalina e noradrenalina que a dosagem das catecolaminas urinárias se sobrepõe à das catecolaminas plasmáticas, com sensibilidade de 100% para a adrenalina e para a noradrenalina14.
d) Metanefrinas e normetanefrinas urinárias
Amostra para dosagem é obtida de urina isolada (mg/mg de creatinina) ou de urina de 24 horas, sendo esta mantida acidificada e refrigerada. Anteriormente, a leitura era realizada por método espectofotométrico e, atualmente, por HPLC. Caso a leitura não seja realizada no mesmo dia, a amostra deve ser congelada1,6,7.
Drogas como a metildopa e os inibidores da MAO estimulam a produção de metanefrinas e normetanefrinas. Já a metilglucamina e os contrastes radiológicos diminuem sua excreção7,13.
As dosagens de metanefrinas e de normetanefrinas são consideradas por muitos como triagem inicial no diagnóstico do feocromocitoma, devendo ser dosadas separadamente. A normetanefrina no feocromocitoma tende a apresentar valores superiores a duas vezes o limite superior da normalidade, estando aumentada mesmo nos casos de noradrenalina normal. Valores menores que 1,1mg/mg de creatinina têm pouca relação com o feocromocitoma. Entretanto, valores maiores que 3,0mg/mg de creatinina sugerem fortemente a presença do tumor5,12.
A sensibilidade da dosagem conjunta de metanefrina e normetanefrina urinárias é de 100%, e a especificidade, de 98%. Quando são dosadas separadamente, a metanefrina tem sensibilidade de 90%, e a normetanefrina, de 70%13.
e) Peptídeos plasmáticos
Neuropeptídeo Y (NPY) está co-localizado com as catecolaminas nas fibras nervosas simpáticas perivasculares e na medula adrenal, contribuindo para o controle pressórico com seu efeito de vasoconstrição direta, potencialização do efeito vasoconstritor da adrenalina e supressão da sua liberação. Entretanto, em estudos com feocromocitomas, não se observou relação direta entre os níveis plasmáticos de NPY e de pressão arterial. O NPYlike-immunoreactivity (NPY-LI) sofre um incremento nos níveis circulantes durante a manipulação tumoral cirúrgica, reduzindo em mais de 70% dos casos sua concentração em cerca de uma hora após a retirada do tumor. Aproximadamente 86% dos feocromocitomas apresentam elevação dos níveis de NPY-LI tecidual em relação as adrenais normais, e, apesar desta, sua utilização no diagnóstico ainda parece limitada17.
f) Catecolaminas plaquetárias
Em pacientes com feocromocitoma, observa-se aumento das concentrações de catecolaminas plaquetárias, sendo estas dependentes da concentração plasmática e do tempo de exposição ao excesso de catecolaminas. Como as plaquetas apresentam sobrevida de 9,5 dias, pode haver dissociação entre os valores de catecolaminas plasmáticas e plaquetárias. A ausência desta dissociação decorreria da redução da meia-vida plaquetária ou por saturação de catecolaminas neurais e extraneurais. Após exérese tumoral há, na maioria dos casos, normalização das catecolaminas plaquetárias cerca de cinco dias pós-cirurgia18.
Graham et al., como pôde ser visto, relataram que nenhum ensaio bioquímico utilizado isoladamente é diagnóstico no estudo do feocromocitoma. Apenas as dosagens conjuntas de adrenalina e noradrenalina, ou metanefrina e normetanefrina, atingiram 100% de sensibilidade, e que, pelo padrão heterogêneo da secreção e metabolização das catecolaminas, mais de um exame bioquímico deve ser realizado. Apesar das vias metabólicas da adrenalina para a metanefrina e da noradrenalina para a normetanefrina parecerem separadas, o aumento de normetanefrina na presença de noradrenalina normal, com o aumento de adrenalina, pode decorrer da alteração da metabolização das catecolaminas em alguns pacientes13.
2) Testes funcionais
Os testes funcionais devem ser utilizados nos casos em que a clínica de feocromocitoma é sugestiva e as dosagens plasmáticas ou urinárias das catecolaminas e seus metabólitos não foram elucidativas no diagnóstico diferencial.
teste de supressão com clonidina (Atensina), proposto inicialmente por Bravo et al., é o mais utilizado. Baseia-se no fato de que a administração de clonidina (agonista a-2-adrenérgico de ação central) provoca, em hipertensos essenciais, redução dos níveis plasmáticos de catecolaminas três horas após a administração da droga, e esse efeito não é observado nos feocromocitomas (em que as catecolaminas se mantêm acima de 500pg/mL). O aumento normal nos níveis de catecolaminas é mediado pela ativação do sistema nervoso simpático, porém, no feocromocitoma, esse aumento decorre do excesso de catecolaminas do tumor e a clonidina não suprime a liberação destas2,9,19.
Alguns cuidados devem ser observados, como a suspensão dos bloqueadores beta-adrenérgicos por pelo menos 48-72 horas antes do teste, evitando falsos positivos (impedem a supressão das catecolaminas em hipertensos essenciais). A sensibilidade é de 97%, mas a especificidade é de apenas 67%. Bravo et al. indicam o uso desse teste em indivíduos com catecolaminas plasmáticas entre 1.000 e 2.000pg/mL9,16,20.
Hipertensos essenciais estudados por Bachmann et al. apresentaram queda significativa dos níveis de noradrenalina (redução de 11-53% em relação aos valores basais) e de adrenalina (redução de 21-100% em relação aos valores basais). Em outro estudo, Bachmann et al. observaram, nos hipertensos essenciais, após três horas da administração da clonidina, supressão significativa da adrenalina e noradrenalina (62 ± 2% e 49 ± 4%, respectivamente). Por outro lado, os feocromocitomas produtores de adrenalina não apresentaram supressão, e os produtores de noradrenalina mostraram redução nos valores de catecolaminas em 33 ± 6%14,21.
Esse teste funcional foi adaptado em nosso meio dosando-se metanefrinas urinárias em amostras isoladas de urina, antes e após três horas da administração de clonidina 0,3mg por via oral, quando se obteve acurácia sobreponível às dosagens plasmáticas5.
teste de estímulo com glucagon também pode diagnosticar casos de feocromocitoma quiescentes, cujas dosagens prévias de catecolaminas e seus metabólitos não foram elucidativas, devendo-se ter em mente o risco de paroxismos graves com crises hipertensivas induzidos pela droga. Assim, esse teste foi por muito tempo abandonado pelo risco de acidentes vasculares cerebrais ou coronarianos durante os picos hipertensivos, atualmente reduzidos pelo uso de bloqueadores alfa-adrenérgicos. Assim, como precaução, o estímulo com glucagon deve ser limitado a pacientes com pressão diastólica menor que 100mmHg5,7,16.
Com o indivíduo em repouso e posição supina por pelo menos 30 minutos, dosam-se catecolaminas plasmáticas antes e após a infusão de um a dois miligramas de glucagon por via endovenosa em bolus. A resposta é considerada positiva quando há incremento de três vezes o valor basal de catecolaminas ou superior a 2.000pg/mL, um a três minutos após a administração do glucagon9,16,19.
A sensibilidade do teste é de 100% e a especificidade, de 81%. Entretanto, em indivíduos com feocromocitoma maligno ou quando o tumor é de caráter familiar, o teste é menos sensível. Em indivíduos normais, o glucagon não tem a capacidade de estimular a liberação de catecolaminas16,19.
A utilização de metoclopramida em teste de estímulo não apresenta vantagens em relação ao glucagon. Sua ação bloqueando o efeito inibitório pré-sináptico dopaminérgico leva à liberação das catecolaminas tumorais com aumento dos níveis pressóricos. Hipertensos essenciais, em estudo realizado por Hsu et al., não apresentaram noradrenalina plasmática basal elevada, e após o teste provocativo observou-se aumento inferior ao limite superior da normalidade ou, até mesmo, redução das catecolaminas plasmáticas. Por outro lado, nos feocromocitomas, a noradrenalina plasmática basal já era significantemente elevada em relação ao grupo anterior, e após a infusão de metoclopramida houve aumento significativo da pressão arterial, bem como da noradrenalina plasmática2,22.
3) Diagnóstico anatômico
A localização do feocromocitoma auxilia no diagnóstico e facilita a ressecção cirúrgica. Cerca de 98% dos tumores apresentam-se na região abdominal, de preferência do lado direito, numa razão de 2:1. Tumores originários das glândulas adrenais e da bifurcação das ilíacas, geralmente, secretam adrenalina, assim como noradrenalina. A ausência do excesso de adrenalina sugere localização extra-adrenal2,4,5.
A ultra-sonografia detecta grande parte dos feocromocitomas, entretanto a tomografia computadorizada é ainda o melhor método de imagem, detectando cerca de 95% das massas adrenais com mais de 1cm, mas com sensibilidade menor em tumores extra-adrenais, em crianças e indivíduos magros. A ressonância magnética tem sido utilizada no diagnóstico mais preciso dos feocromocitomas, porém necessita-se de maior experiência para determinação de sua especificidade nesses tumores. Apresenta vantagens como o não uso de radiação e a visualização de vasos sem contraste3,5,9,23,24.
O mapeamento com 131I metaiodobenzilguanidina (131I MIBG) é útil na localização de feocromocitomas, mas sua melhor indicação é nos casos de recidiva tumoral, em locais de cirurgia prévia, feocromocitomas extra-adrenais e metástases, com poucos falsos positivos. Sendo um análogo da guanetidina, apresentando certas similaridades estruturais com a noradrenalina, a 131I MIBG é captada por tumores secretores de catecolaminas ou tecidos cromafins funcionantes. Falsos negativos podem decorrer do uso de propranolol, labetalol, antidepressivos tricíclicos, reserpina e inibidores da MAO. O uso dessas medicações deve ser suspenso no mínimo 30 dias antes da administração do radiotraçador, já que bloqueiam a captação ou armazenamento das catecolaminas, podendo induzi-lo com a 131I MIBG. Glândulas salivares, fígado, baço e outros tumores neuroendócrinos, como tumores carcinóides, carcinoma medular da tiróide e paragangliomas, também podem captar 131I MIBG25,7,9,23,25,26.
O uso de 123I , ao invés de 131I MIBG, tem como vantagens a redução da radiação e aumento da sensibilidade do mapeamento, tendo sido utilizado no estudo de Deal. Entretanto, com o uso de 123I, as adrenais normais também são visualizadas, sendo, assim, difícil a distinção com as anormais3,10.
Pela presença de alguns exames falsos-positivos, administra-se 131I MIBG em baixas doses (cerca de 0,5mCi), com captação às 24, 48 e 72 horas, e a maioria dos feocromocitomas são visualizados entre 24 e 48 horas. Já a captação de 72 horas pode visualizar adrenais normais25.
Uma nova opção para o diagnóstico do feocromocitoma é a utilização de positron emission tomography (PET), após a administração de 2(fluorine-18)-fluoro-2-deoxy-D-glicose (FDG) EV 10mCi, e o acúmulo em tumores indica atividade metabólica. Esse método pode localizar feocromocitomas extra-adrenais não localizados com 131I MIBG. Entretanto, mais estudos são necessários para a determinação de sua real eficácia27.
Maurea et al. compararam a captação com 131I MIBG, tomografia computadorizada e ressonância magnética, evidenciando, em pacientes ainda não submetidos à cirurgia do feocromocitoma, sensibilidade de 82% no 131I MIBG, e de 100% nos dois outros métodos. Quanto à especificidade, foi de 100% no 131I MIBG e de 50% na tomografia computadorizada e ressonância magnética. Por outro lado, em pacientes já submetidos à ressecção cirúrgica adrenal, a sensibilidade encontrada no 131I MIBG, tomografia computadorizada e ressonância magnética foi de 83%, 75% e 83%, respectivamente. Quanto à especificidade, foi de 100%, 67% e 67%, respectivamente. Assim, o estudo sugere que a tomografia computadorizada e a ressonância magnética devem ser consideradas como principais métodos de imagem nos casos ainda não submetidos à cirurgia, já que na maioria destes o feocromocitoma localiza-se, principalmente, nas adrenais, ou pelo menos na cavidade abdominal. Quando o tumor é recorrente, maligno, em que as localizações extra-adrenais são mais comuns, o 131I MIBG é o método de escolha26.
A cateterização seletiva venosa pode ser realizada quando não se evidencia radiologicamente o tumor, apesar da clínica e laboratório. É necessário preparo prévio com bloqueadores alfa e beta-adrenérgicos, dosando-se as catecolaminas plasmáticas por via transfemoral. Os principais riscos na cateterização seletiva são: infarto da glândula adrenal e liberação de catecolaminas pela manipulação do tumor. A localização precisa dos pontos de coleta sanguínea é obtida por meio da flebografia e dosagem de cortisol plasmático6,9,27,28.
A arteriografia pode ser realizada quando há suspeita de feocromocitoma extra-adrenal ou quando a tomografia não localiza o tumor, mas é um método invasivo pouco utilizado, freqüentemente precipitando crises hipertensivas2,29.


FONTE : http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-42301997000300012&script=sci_arttext

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